Fibrilhação auricular associada a mais problemas de saúde

A Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC) anunciou o lançamento do EHRA-PATHS, um projeto financiado pela União Europeia (EU) para melhorar a gestão de doentes idosos com fibrilação auricular com múltiplas comorbilidades. O anúncio surgiu durante o EHRA 2021, o congresso anual online da Associação Europeia do Ritmo Cardíaco (EHRA) da Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC).

Mais de 40 milhões de indivíduos em todo o mundo têm fibrilhação auricular, a arritmia cardíaca mais comum. O risco de desenvolver esta patologia aumenta com a idade e o número de comorbilidades, incluindo tensão arterial elevada, diabetes, insuficiência cardíaca, doença arterial coronária, doença renal, obesidade, e apneia obstrutiva do sono. Os doentes com fibrilhação auricular têm em média cinco comorbilidades com impacto negativo na sobrevivência e, por isso, três quartos dos doentes com fibrilhação auricular tomam pelo menos cinco medicamentos.

O coordenador científico do EHRA-PATHS, Hein Heidbuchel, afirmou que “a fibrilhação auricular é um sinal de aviso de que os doentes podem ter outras patologias, o que justifica a polimedicação. Isto apresenta enormes desafios na garantia de que todas as doenças são tratadas e os doentes recebem uma terapia bem adaptada.”

“Vamos criar uma ferramenta de gestão para ajudar os médicos a adotar uma abordagem integral e sistemática aos doentes com fibrilhação auricular que garanta que todas as comorbilidades sejam identificadas e tratadas”, explicou o coordenador.

Acrescentou que “a ferramenta não decide como deve ser feita a gestão dos doentes obesos, mas recordará aos médicos que a questão precisa de ser tratada e adaptada aos protocolos do seu hospital, às disponibilidades locais e às preferências dos doentes.”

“Como resultado deste projeto, esperamos que a apresentação da fibrilhação auricular seja aproveitada como uma oportunidade pela comunidade médica para abordar metodicamente as comorbilidades. Isto deverá conduzir a uma melhor gestão de doentes individuais, menos polifarmácia, e a uma melhor adesão a terapias eficazes”, concluiu.

Um dia com a Cardiologia

A 2.ª edição das Jornadas Formativas “Um dia com a Cardiologia”, a realizar-se em formato online a 26 e 27 de novembro, vão promover a partilha de conhecimentos e experiências, através da formação contínua na abordagem da patologia cardiovascular nos Cuidados de Saúde Primários (CSP), em articulação com os cuidados especializados de Cardiologia. Jornadas estas que têm como público-alvo especialistas, seja em Medicina Interna ou Medicina Geral e Familiar (MGF).

Organizadas pelo Núcleo de Internos e Orientadores de Formação da Unidade de Saúde Familiar Nascente (NIOF da USFNS) do ACeS de Gondomar em colaboração com o serviço da Cardiologia do Centro Hospitalar e Universitário do Porto (CHUP), estas Jornadas Formativas centram-se nos temas da insuficiência cardíaca e da fibrilhação auricular.

Os interessados podem submeter trabalhos até 1 de novembro, que serão avaliados pela especialista em MGF Liliana Teixeira e pelos especialistas em Cardiologia Filomena Oliveira e Paula Teixeira.

Estudo da U.Porto aponta falhas no tratamento da fibrilhação auricular

Uma percentagem muito significativa de doentes com fibrilhação auricular — a arritmia cardíaca mais comum na população — não está a ser tratada de forma adequada. O alerta foi hoje tornado público por um grupo de investigadores da Universidade do Porto (U.Porto), na sequência de trabalho publicado no British Medical Journal Open (BMJ Open).

De acordo com a referida investigação, agora noticiada pela agência Lusa, cerca de 27% dos doentes com este tipo de alteração do ritmo cardíaco não está a fazer anticoagulação, embora tenha “indicação para receber este tratamento”. Desse universo, 79% apresenta “elevado risco de sofrer um evento trombótico”.

Os investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) e do CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde fazem saber que, entre os doentes sem indicação para receberem anticoagulantes (apenas 4,2% do total), 40% está a fazer tratamento desnecessário.

“Este estudo desperta a comunidade médica para uma realidade em que coexistem doentes com fibrilhação auricular subtratados e doentes sobretratados”, sublinha, em comunicado, o investigador da FMUP/CINTESIS e coordenador do estudo, Carlos Martins. Os primeiros, de facto, “carecem de otimização terapêutica para prevenção do acidente vascular cerebral (AVC)”. Em contraponto, no segundo caso, os doentes e estão a ser tratados desnecessariamente e sujeitos aos efeitos adversos desse tratamento”.

Susana Silva Pinto, primeira autora deste trabalho, reitera que “esta informação é da maior importância porque os médicos devem ser proativos na prevenção do AVC em doentes com fibrilhação auricular”, esclarecendo que “o objetivo desta terapêutica é prevenir episódios de trombose em doentes de risco, seguindo o ‘score’ CHA2 DS2 – VASc”.

À luz da informação hoje conhecida, a Região Norte de Portugal tem identificados 63.526 doentes com fibrilhação auricular, em que 53% são mulheres, numa faixa etária bem distendida 18-107 anos (76,5 anos em média). O risco de AVC nesse universo com arritmia cardíaca é cinco vezes maior, traduzindo 15% do total de casos desta patologia.

Sucede, explicam os investigadores da U.Porto, que a maior parte dos indivíduos identificados “(95,8%) tem indicação para fazer anticoagulação”, e, neste grupo, aproximadamente “40% está a ser medicado com fármacos como a varfarina (a mais prescrita)” — sujeitos a análise laboratorial periódica — “e cerca de 60%” está a receber “os novos anticoagulantes orais, que dispensam esse controlo”.

A fibrilhação auricular atinge, assinala esta pesquisa, 3% por cento dos portugueses com idade igual ou superior a 40 ano. Uma arritmia associada a comorbilidades, principalmente, hipertensão arterial (em 77% dos casos), alterações no perfil lipídico (52%), diabetes (28%) e insuficiência cardíaca (27%).

Susana Silva Pinto, Andreia Teixeira, Teresa Henriques e Carlos Martins, em representação do FMUP/CINTESIS, e Hugo Monteiro, da Administração Regional de Saúde do Norte, constituem a equipa que participou neste estudo.