Cientistas decifram como as interações neuroimunes queimam gordura visceral

Um estudo pioneiro, com participação de cientistas portugueses, revelou novas alternativas terapêuticas para reduzir as reservas de gordura visceral, que têm sido associadas a doenças cardiovasculares e vários tipos de cancro.

Existe uma relação entre a obesidade e, pelo menos, 13 tipos de cancro, incluindo dois dos mais prevalentes — cancro da mama e cancro colorretal — bem como doenças cardiovasculares que continuam a ser uma das principais causas de morte em todo o mundo.

O estudo, publicado na revista científica Nature, teve o contributo do imunologista Henrique Veiga-Fernandes, codiretor da linha de investigação no Centro Champalimaud, em Lisboa, e da investigadora Ana Filipa Cardoso, primeira autora do artigo e a fazer o seu pós-doutoramento no laboratório de imunofisiologia liderado por Veiga-Fernandes.

Os resultados do estudo apresentam aquele que é o primeiro processo neuroimune conhecido, através do qual sinais cerebrais comandam a função imunológica nos depósitos de gordura visceral. Esta descoberta oferece novas abordagens ao combate à obesidade e às doenças a ela associadas.

“O excesso de gordura visceral para além de muito perigoso é também muito difícil de eliminar”, explica Henrique Veiga-Fernandes. “Neste projeto, a nossa equipa propôs-se a explorar os mecanismos que o reduzem naturalmente, na expectativa de descobrir potenciais aplicações clínicas”.

Esta comunicação obedece a uma “voz de comando”, dada numa região do sistema nervoso central, perto da base do cérebro, chamada núcleo paraventricular do hipotálamo, que controla diversos processos, incluindo o metabolismo, a reprodução e funções gastrointestinais e cardiovasculares, precisa em comunicado a Fundação Champalimaud.

A comunicação “começa com sinais neuronais para as MSC [células mesenquimais]. Estas enviam depois uma mensagem para as ILC2, à qual estas últimas respondem ordenando que as células de gordura acelerem o seu metabolismo”, descreve Ana Filipa Cardoso, citada no comunicado.

“Esta descoberta é muito significativa”, acrescenta o investigador, “É o primeiro exemplo claro de um circuito neuronal cruzado que traduz as informações do cérebro numa função imunológica relacionada com a obesidade. E também levanta muitas outras questões. Por exemplo, o que leva o PVH a emitir a ordem para ‘queimar gordura’? Está relacionado com o comportamento, como comer certos alimentos ou fazer exercício? Ou depende de sinais metabólicos internos? Ou ambos? É uma tela em branco, não sabemos o que é, e isso é fascinante.”