Estudo conclui que tabaco pode explicar envelhecimento prematuro do coração

Um estudo que juntou investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) e da Universidade de Lorraine, em França, concluiu que o tabagismo pode ser responsável pelo envelhecimento do coração em cerca de 20 anos.

“A lesão celular induzida pelo cigarro e a resposta imune inflamatória são os dois prováveis mecanismos que explicam o envelhecimento prematuro do coração e o aumento da incidência de doenças crónicas em fumadores”, referiu o investigador da Unidade de Investigação Cardiovascular (UnIC) da FMUP.

João Pedro Ferreira, um dos autores do estudo levado a cabo com cidadãos de Lorraine, explicou que se verificou que “os fumadores, mesmo que tivessem 20 anos, apresentavam uma idade vascular semelhante a uma pessoa e 35 ou 40 anos”.

“E tinham uma expressão de proteínas [conhecidas por iniciar e facilitar a progressão da lesão aterosclerótica] no sangue que mostrava que tinham uma ativação de inflamação de vias inflamatórias. Algumas proteínas que estão associadas à ocorrência de alguns cancros estavam ativadas. Portanto, conclui-se que o próprio tabaco cria um perfil inflamatório no sangue que pode levar à lesão dos vasos e criar outras doenças, porque vai fazendo pequenas lesões nas células ao longo o tempo”, desenvolveu.

O estudo consistiu na realização de exames junto de uma população de mais de 1500 fumadores, antigos fumadores e pessoas que nunca fumaram. A amostra incluiu pessoas com idades entre os 18 e os 70 anos, sendo que a maior parte eram adultos entre os 40 e os 50.

De acordo com a FMUP, “os investigadores constataram que, apesar de serem cerca de 18 anos mais jovens, os fumadores atuais apresentavam níveis semelhantes de hipertensão, diabetes e lesão vascular aos de pessoas mais velhas que nunca fumaram”.

João Pedro Ferreira apontou que foi comparado o dano cardiovascular e que, quando constatado que o vaso estava mais rígido, isso significa que esse tem menos elasticidade e está a funcionar pior. “Estar mais rígido é como estar danificado, estar mais envelhecido”, resumiu. O investigador salvaguardou que os casos estudados não foram “necessariamente” de doentes, tratando-se este de um estudo populacional em que se procurou saber os hábitos e estilos de vida.

“Este é um estudo observacional. Estamos a ver as características das pessoas comparadas com outras. Não podemos inferir que existe uma causalidade. Não podemos inferir que o tabaco causa diabetes. O que podemos dizer é que existe uma relação entre as pessoas que fumavam e algumas proteínas que parecem indicar alguma tolerância menor à glucose, ao açúcar”, exemplificou.

João Pedro Ferreira destacou, por fim, que “o grupo que já tinha deixado de fumar tinha uma atenuação dos efeitos, mas esses não estavam completamente revertidos”. “Obviamente que é bom deixar de fumar o quanto antes, mas o estudo conclui que o dano vascular que já tinha ocorrido no passado regista melhorias, mas não reverteu”, concluiu, sublinhando que o estudo alerta que, “mesmo que a pessoa se sinta bem, há um dano que está a acontecer no corpo que é silencioso e que esse dano pode trazer consequências” como enfarte do miocárdio ou acidentes vasculares cerebrais, doença arterial periférica, bem como cancro do pulmão, garganta ou bexiga.

De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde, o tabaco é responsável por mais de seis milhões de mortes em todo o mundo a cada ano. Com o nome “Impact of smoking on cardiovascular risk and premature ageing: Findings from the STANISLAS cohort”, este estudo junta o João Pedro Ferreira aos investigadores Tripti Rastogi, Nicolas Girerd, Zohra Lamiral, Emmanuel Bresso, Erwan Bozec, Jean-Marc Boivin, Patrick Rossignol e Faiez Zannad.

Portugueses desconhecem que alterações climáticas afetam doentes cardiovasculares

Dois em cada três portugueses desconhecem efeitos negativos das alterações climáticas na doença cardiovascular. Nesse sentido, a Fundação Portuguesa de Cardiologia (FPC) promoveu um estudo, em parceria com a GfK, sobre o impacto potencial das alterações climáticas e as doenças do coração.

O estudo alerta que “apenas 33 % dos portugueses revelaram ter plena noção de que as alterações climáticas têm efeitos nefastos para a saúde cardíaca”, embora os inquiridos admitam que possa ter impacto na saúde da pele (66 %) e que se possa traduzir em problemas psicológicos (50%).

 Verifica-se também que cerca de “10% dos inquiridos considera que as alterações climáticas não têm qualquer impacto na saúde cardiovascular, tendo-se registado a mesma percentagem (10%) para os que consideram que os fenómenos atmosféricos são uma invenção da comunidade científica”.

No entanto, de acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde e a Organização Mundial da Saúde (OMS), quando exposto a extremos climáticos como calor ou frio, o corpo humano ativa mecanismos fisiológicos compensatórios para se proteger dos efeitos dessa exposição, e esses mecanismos podem afetar o sistema cardiovascular.

 O estudo da GFK revelou que, apesar de “80% dos portugueses saberem que as alterações climáticas são um fenómeno causado pela concentração excessiva de gases de efeito de estufa e a maioria (92%) considerar que, nos próximos anos, os efeitos das alterações climáticas vão aumentar, os dados revelam que não interligam este fenómeno com efeitos prejudiciais para a saúde (potenciador de vários tipos de doença, sobretudo do foro cardiovascular”. Ficou ainda patente que “apenas 35% admitiu que as alterações climáticas podem aumentar os casos de taquicardia, infarto do miocárdio e hipertensão arterial (31%) e insuficiência cardíaca (27%)”.

A FPC sublinha ainda que é preciso um esforço conjunto por parte dos profissionais de saúde e da população em geral para saber como atuar mediante a situação climática atual. 

 

Estudo aponta para duplicação do número de hipertensos em 30 anos

Segundo um estudo, publicado na revista médica britânica The Lancet, nos últimos 30 anos, o número de hipertensos duplicou, à escala mundial, para 1,27 mil milhões, sendo que em 2019, 720 milhões de pessoas continuavam por tratar.

Liderado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Imperial College London, o trabalho apresentou estimativas globais sobre prevalência, diagnóstico, tratamento e controlo da hipertensão a partir da análise de dados de 1.201 estudos realizados entre 1990 e 2019, envolvendo 104 milhões de pessoas.

Na lista de 10 países, Portugal surge destacado “com as mais altas taxas de tratamento de mulheres hipertensas em 2019, (…) 71%, enquanto Moçambique apresenta as mais baixas taxas de tratamento” reportadas a ambos os sexos.

De acordo com a metanálise, o número de hipertensos passou de 648 milhões, em 1990, para 1,27 mil milhões, em 2019. Os autores apontam que esse aumento reflete o crescimento e o envelhecimento da população.

O artigo realça que, apesar de a hipertensão ser simples de diagnosticar, em 2019, quase metade das pessoas no mundo desconhecia a sua condição, por falta de diagnóstico e na sua maioria não foram tratadas”.

O trabalho sublinha, ainda, que a redução da tensão arterial pode diminuir o número de episódios de AVC (35%-40%), ataques cardíacos (20%-25%) e insuficiência cardíaca (cerca de 50%).

Tabaco é responsável por uma em cada cinco mortes por doença cardiovascular, alerta OMS

Cerca de 20% das mortes por doenças cardiovasculares (DCV) são causadas pelo tabaco, segundo um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) ontem divulgado, que aponta que, por ano, morrem cerca de 1.9 milhões pessoas devido ao consumo de tabaco.

De acordo com o relatório, em que participaram também a Federação Mundial do Coração e a universidade australiana de Newcastle, os quase dois milhões de mortes registados anualmente equivalem a uma em cada cinco mortes por DCV.

Face a estes dados, os autores do documento apelam a que as pessoas deixem de fumar, sublinhado que os fumadores têm uma maior probabilidade de sofrerem um evento cardiovascular agudo em idade jovem, em comparação com os não fumadores.

“Fumar só alguns cigarros por dia, fazê-lo ocasionalmente ou até a exposição passiva ao fumo aumentam o risco de DCV”, acrescenta a OMS em comunicado, esclarecendo que deixar de fumar permite reduzir o risco em cerca de 50%, ao final de um ano.

Para o presidente do Grupo de Especialistas em Tabaco da Federação Mundial do Coração, os serviços de saúde devem trabalhar também na solução para este problema e os próprios médicos cardiologistas devem ser treinados nesse sentido.

“Tendo em conta o atual nível de evidência sobre o tabaco e a saúde cardiovascular, e os benefícios para a saúde de deixar de fumar, não disponibilizar serviços de cessação a pessoas com DCV pode ser considerado negligência médica”, considera Eduardo Bianco, citado em comunicado.

O dados mostram ainda que o tabaco, mesmo sem ser fumado, é responsável por cerca de 200 mil mortes de doença coronária todos os anos e até os cigarros eletrónicos fazem aumentar a pressão arterial, aumentando, consequentemente, o risco de DCV.

O relatório agora divulgado, antecipa o Dia Mundial do Coração, que se assinala a 29 de setembro, mas não foge ao momento atual e alerta que o contexto da pandemia da Covid-19 torna o problema ainda mais premente.

Segundo um estudo recente da OMS, entre as vítimas mortais da Covid-19 em Itália, 67% tinham hipertensão e em Espanha 43% das pessoas que desenvolveram a doença tinham também outras doenças cardiovasculares.

Para o chefe da Unidade Sem Tabaco da OMS, o controlo do tabagismo é essencial na redução das DCV e, por isso, os governos devem assumir também esse papel.

“Os governos têm uma responsabilidade de proteger a saúde das pessoas e ajudar a reverter a epidemia do tabaco. Tornar as nossas comunidades livres do tabagismo reduz o número de internamentos hospitalares relacionadas ao tabaco, algo que é mais importante do que nunca no contexto da atual pandemia”, sublinhou Vinayak Prasad.

No mesmo comunicado, a OMS acrescenta que os governos podem contribuir através do aumento de impostos sobre o tabaco, da proibição da publicidade e da disponibilização de serviços para ajudar as pessoas a deixar de fumar.